(English below)
Jair Bolsonaro (Partido Social Liberal), um deputado de extrema direita que idolatra a ditadura militar que governou o Brasil entre 1964-1985, conquistou a presidência do maior país da América Latina. É a mudança política mais radical do Brasil desde que a democracia foi restaurada há mais de 30 anos. O presidente eleito que exalta torturadores, ameaçou destruir, prender ou exilar seus oponentes políticos. Durante a campanha apresentou-se como “novo” e aquele que “salvaria” o Brasil da atual crise, mesmo que em 30 anos como deputado federal não tenha produzido nada relevante.
Bolsonaro já foi filiado em sete siglas partidárias. No período de 2005-2016 ele estava no Partido Progressista, um dos mais citados na operação Lava- Jato. Ele se filiou ao PSL em 2018, preferindo concorrer à presidência neste partido para fugir das denúncias de corrupção e seu envolvimento na sua antiga legenda.
O país, que já passava por uma onda de retrocessos de direitos desde o golpe disfarçado de impeachment da presidenta Dilma Roussef em 2016, corre agora o risco de ver diversos direitos conquistados nos últimos 30 anos de democratização serem usurpados. Bolsonaro representa uma ameaça para os povos indígenas e quilombolas, negros, mulheres, LGBTs, povos tradicionais, movimento sociais e organizações da sociedade civil. Bolsonaro também fez uso da instrumentalização da fé a serviço do poder político. Um escancarado e perigoso desrespeito ao Estado Laico
As suas propostas para flexibilizar leis de controle de armas e autorização prévia para policiais matarem em serviço são extremamente criticadas por defensores de direitos humanos, que estimam aumento no contexto da violência letal no país. O Brasil já contabiliza mais de 63 mil homicídios por ano, 70% deles com armas de fogo.
A campanha de Jair Bolsonaro foi agressiva, repleta de desinformação e fake news voltadas diretamente aos celulares dos eleitores. Em um país onde o uso do WhatsApp é enorme, mensagens carregadas de mentiras se tornaram virais. Com um discurso de ódio contra as minorias e opositores, a disseminação massiva de notícias falsas relacionadas a crise econômica vivida no país e ao candidato opositor, Fernando Haddad (Partido dos Trabalhadores), Bolsonaro foi capaz de capitalizar o medo e incerteza quanto ao futuro que grande parte da população brasileira vem enfrentando.
Nas declarações do presidente eleito, denúncias jornalísticas foram chamadas de “fake news”, movimentos sociais se transformaram em “organizações terroristas” e manifestações populares são tachadas como “ataques à democracia”. Ele também ameaçou os seus opositores políticos e militantes dos movimentos sociais afirmando que no seu governo “marginais vermelhos serão banidos da nossa pátria”, em referência aos movimentos sociais que lutam pelo acesso à terra e moradia digna.
A transição de governo foi iniciada logo após o resultado das urnas e esses 45 dias de transição já estão sendo utilizados para forçar a aprovação de propostas que representam retrocessos em direitos sociais e liberdades democráticas. Em sintonia com o governo de Michel Temer, anunciou-se o esforço para aprovar a Reforma da Previdência na Câmara dos Deputados. Proposta que é rejeitada por 71% dos brasileiros (segundo o Datafolha). Há ainda a tentativa apressada de votar em comissões do Senado e da Câmara dos Deputados os projetos que criminalizam movimentos sociais como “terroristas” e o chamado Escola Sem Partido, instituindo uma patrulha de censura aos professores e ao debate plural em escolas e universidades.
Guilherme Boulos, o principal líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) escreveu em artigo na Folha de S. Paulo: “Os ataques a movimentos sociais têm tomado como alvos principais o MTST e o MST. Parecem desconhecer o fato de que estes não existem por vontades de lideranças, mas pela histórica negação dos direitos à moradia e à terra. Temos uma das estruturas agrárias mais concentradas do mundo e mais de 6 milhões de famílias sem acesso à moradia digna”.
Para o Ministério da Justiça, o Juiz Sérgio Moro foi convidado e aceitou a pasta. O juiz que ajudou a mandar Lula para prisão e que disse que nunca iria para a política aceita o “superministério”. Uma decisão que alimenta questionamentos a sua conduta. Principalmente porque no início do ano, Lula liderava todas as pesquisas de intenções de votos, Bolsonaro estava bem atrás em segundo lugar. Com a prisão de Lula, Jair Bolsonaro passou a liderar as intenções de voto e conseguiu se eleger presidente.
A política externa do presidente eleito Jair Bolsonaro será o inverso dos governos do Partido dos Trabalhadores. Na via contrária à aproximação com os países da América Latina e o fortalecimento das relações sul-sul, que pretendia criar um núcleo de poder alternativo aos Estados Unidos da América, Bolsonaro já deixou clara sua admiração pelo presidente americano, Donald Trump, e por Israel. Também gerou constrangimento e controversas com a China e outros parceiros comerciais brasileiros. E afirmou que não pretende se relacionar com “ditaduras” como a Venezuela.
O economista Paulo Guedes, líder da equipe econômica de Bolsonaro assumirá o Ministério da Economia, que reunirá dois ministérios extintos: o da Fazenda e o da Indústria, Comércio Exterior e Serviços. Já há rumores de criação de mais impostos e cortes em recursos para gastos básicos do governo em saúde e educação, pois deverá “diminuir” o tamanho do Estado.
Enquanto isso o racismo e a homofobia voltaram a ser mais explícitos no Brasil. Eleitores de Bolsonaro promovem discurso de ódio e agressões à negros e LGBTs. Comunidades indígenas e assentamentos de trabalhadores sem terra foram ameaçados e atacados. Mas não é apenas a estas violências que as minorias estão sujeitas, existe uma violência de estado que pode provocar uma guerra de classes no país.
O Brasil neste momento precisa de toda solidariedade internacional para apoiar a luta por direitos, para garantia da vida dos defensores de direitos humanos e dos militantes que fazem a luta pela terra e moradia. O Estado Democrático de Direitos está em risco, assim como a própria democracia e a liberdade de expressão já foram violentamente atacados. A recessão econômica deve se acentuar e o conflito social se acirrar, aprofundando as desigualdades existentes no país.
Nós do PAD continuaremos lutando pela democracia e empenhados em denunciar nos órgãos internacionais as violações de direitos e ataques a democracia brasileira.
Processo de Articulação e Diálogo Internacional
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The election of an extreme-right congress member as President of Brazil poses a threat to human rights defenders
Jair Bolsonaro (Social Liberal Party) is an extreme right congress member who praises the military dictatorship that ruled Brazil between 1964 and 1985. Now, he has been elected President of the largest country in Latin America. This is the most radical political change in Brazil since the restoration of democracy in 1985. The president elected glorifies torturers and has threatened to destroy, arrest or exile his political opponents. During his campaign, he introduced himself as “something new” and “a savior” for Brazil and its current crisis. However, he has not accomplished anything relevant in his almost 30 years in the Congress.
Bolsonaro has been affiliated to seven different parties. Between 2005 and 2016, he was a member of the Progressive Party, one of the most mentioned parties in the “Lava Jato” investigation. He joined PSL in 2018 and chose to run for presidency in that party in an attempt to apart himself from the reported corruption involving his previous party.
The country has been facing countless setbacks and losses of rights since the coup disguised as impeachment suffered by President Dilma Rousseff in 2016, and now many of the rights conquered over the past 30 years of democratization are at stake. Bolsonaro represents a threat to indigenous and quilombola peoples, as well as black people, women, LGBT people, traditional peoples, social movements and civil society organizations. Bolsonaro also instrumentalized his faith and put it at service of his political power, showing complete disregard for the secularity of the state.
His proposals to loosen the gun control legislation and the permission for police officers to kill on duty are fiercely criticized by human rights defenders, who expect lethal violence in the country to increase. Brazil registers more than 63,000 homicides a year, 70 per cent of which are caused by firearms.
Jair Bolsonaro’s campaign was aggressive, and spread disinformation and fake news directly into his voters’ mobile phones. In a country where the use of WhatsApp is massive, many deceiving messages went viral. By use of hate speech against minorities and rivals and the continuous dissemination of fake news related to the economic crisis in the country and to opposing candidate Fernando Haddad (workers Party), Bolsonaro managed to take advantage of the feelings of fear and the uncertainty regarding the future that permeate the Brazilian society.
In his speeches, the elected president called journalistic denunciations “fake news”, referred to social movements as “terrorist organizations” and described demonstrations as “attacks to democracy”. He also threatened his political opponents and social movement activists by affirming that, in his government, “‘red’ outlaws will be banished from our homeland”, in a reference to the social movements that struggle for the access to land and decent housing.
The government transition began shortly after the result in the ballots was revealed, and these 45 days of transition are being used to push the approval of proposals that represent setbacks to social rights and democratic freedoms. In alignment with the Michel Temer administration, an effort to approve the Social Security Reform in the House of Representatives was announced. That proposal is rejected by 71 per cent of Brazilians, according to Datafolha. There is also a rushed attempt to vote law bills that criminalize social movements as “terrorism” and the so-called “Schools Without Parties”, which establishes a censorship witch hunt that affects teachers and debates in schools and universities.
Guilherme Boulos, the most prominent leader of the Homeless Workers Movement (MTST) wrote in an article for newspaper Folha de São Paulo: “The offensive against social movements mostly targets the Homeless and the Landless Workers Movements. They seem to be unaware that they do not exist by will of their leaders, but by the historical denial of the rights to housing and land. We have one of the most concentrated agrarian structures in the world and more than 6 million families with no access to decent housing”.
Judge Sérgio Moro was invited for the Ministry of Justice and accepted the position. The judge who took part in the arrest of Lula and once said he would never get into politics accepted this “super ministry”. That decision raises questions about his conduct, particularly because, by the beginning of the year, Lula led all election polls and Bolsonaro was in a distant second place. After Lula was arrested, Bolsonaro took the lead in the opinion polls and managed to be elected president.
Jair Bolsonaro has already signaled that his external policy will be the opposite of the one adopted by the Workers Party. Instead of fostering a closer relationship with Latin American countries and the strengthening of South-South bonds so as to create an alternative power to the United States, Bolsonaro has already expressed his admiration for North American president Donald Trump and for Israel. He has also created embarrassment and controversy in the relations with China and other Brazilian commercial partners. Moreover, he stated that he does not wish to have relations with “dictatorships” such as Venezuela.
Economist Paulo Guedes, leader of Bolsonaro’s economic team, will be in charge of the Ministry of Economy, which will merge two former ministries: the Ministry of Finance and the Ministry of Industry, Foreign Trade and Services. There are rumors about the creation of more taxes and cuts in basic expenses such as health and education, in order to “shrink” the State.
Simultaneously, racism and homophobia became increasingly explicit in Brazil. Bolsonaro supporters promote the hate speech and assaults to black and LGBT people. Indigenous communities and landless workers settlements have been threatened and attacked. However, that is just part of the violence to which minorities are subject, for there is also the state violence, which may lead to a class war in the country.
Right now, Brazil needs all international support to fight for rights, to protect the lives of human rights defenders and activists that struggle for land and housing. The rule of law is at stake, as well as democracy itself and freedom of speech, which have already been severely attacked. The economic recession is bound to worsen and social conflicts may escalate, increasing inequality in the country.
We from PAD take the pledge to continue in our struggle for democracy and to report rights violations and attacks against the Brazilian democracy to international organizations.
International Articulation and Dialog Process